Lis - Por Jullia de Assis

Eu te entendo
Eu sempre te entendi
Só não vou conseguir te deixar partir
Não faz assim, pensa em mim
Pq quer ir embora assim?
Sei que dói, mas vc se reconstrói
Vai doer e como sempre estarei aqui te ajudando a se reerguer
Vc é forte, mulher de sorte
Já até enfrentou a morte

Jullia de Assis

Circo - Baú


O circo estava armado, os palhaços maquiados, prontos para entrar. Malabaristas andavam pelos camarins a toda hora de um lado para o outro apressando a todos. Uma confusão só. A platéia era enorme, e me parecia extremamente ansiosa para que tudo enfim começasse. Várias e várias crianças com sorrisos imensos estampados na cara esperando para ver pela primeira vez o mundo da fantasia entrar em cena. Menos uma. Ela não sorria. Nem chorava. Mas seus olhos estampavam medo. Era com certeza a criança mais assustada que eu já vi. Ela me pareceu sozinha, sua única companhia era um urso azul, que apertava até não poder mais. Parecia ser a única coisa com sentido pra ela naquele momento. E talvez fosse. Talvez nunca tivesse ido ao circo, talvez estivesse sozinha e perdida, talvez apenas assustada com tanto barulho, tanta gente, tanta coisa estranha.
O espetáculo começara. Palhaços, malabaristas, contorcionistas, bailarinas, meninas que cabiam numa pequena mala.  E enfim o mágico, o tão esperado mágico. Enfim minha vez de entrar em palco. Confesso que ainda fico nervosa ao entrar no palco, mesmo sabendo que nunca deixaram de bater palmas pra qualquer coisa que eu fizesse. Quando pisei naquele picadeiro minhas pernas tremeram, o circo nunca havia enchido tanto. Pela primeira vez não ouvi meu nome sendo anunciado por causa do barulho que as pessoas faziam. A menina de cabelos negros e pele mais branca que a da branca de neve me parecia mais assustada, com mais medo. Estava curiosa pra saber o que estava acontecendo com aquela criança, mas não podia deixar de aproveitar tanta gente ali prestando atenção em mim. Acabei me distraindo, e quando o espetáculo acabou, todos se levantaram pra ir embora, e naquela confusão eu não a vi mais. Onde estaria aquela menina minúscula que segurava um ursinho azul? Corri no meio das pessoas, olhava pra todas as crianças que eu via, mas nenhuma se parecia com ela. Como pode uma criança tão marcante sumir? Será que havia ido embora antes do espetáculo acabar? Depois de uns dez minutos procurando, desisti. Voltei ao lugar onde ela havia sentado e para a minha surpresa lá estava ela. Sozinha, desta vez sem ursinho e chorando.
Fiquei paralisada olhando pra uma menina tão pequena, chorando em silêncio. Ela me encarava nos olhos, e muitas lágrimas caiam sem parar, por alguns segundos senti-me culpada por tanta tristeza. Parecia que estava esperando que eu fizesse alguma coisa, que eu quebrasse aquele momento e a fizesse sorrir, mas eu não sabia o que fazer, mal sabia o que pensar. Estávamos a uns dois metros de distância, e parecia haver uma enorme parede de vidro nos separando. E então, ela a quebrou. A menina enxugou as lágrimas e correu em minha direção. Assustei-me um pouco, mas esperei. Ela chegou perto de mim e sem hesitar abraçou minhas pernas. Abaixei-me e retribuí. Não sei exatamente por quanto tempo fiquei ali, ajoelhada abraçando uma menina que nunca havia visto, se quer trocado uma palavra. Sem dúvidas, o abraço mais acolhedor que já havia recebido. Ela continuou chorando, e eu chorei junto, não sabia o motivo, mas foi mais forte que eu. Ouvi uma voz masculina ao longe, não me importei muito no começo, mas a voz ia ficando mais forte, mais perto e mais nítida. Aquela voz, não me era estranha... Eu conhecia aquela voz de algum lugar. Foi então que senti que alguém arrancava a menina de meus braços. Foi tão rápido que mal pude agir. Nunca percebi tantas coisas em tão poucos segundos. Era um homem forte e alto. Me pareceu familiar. Eu podia estar enganada, afinal, trabalhar no circo me leva a conhecer muitas pessoas. Ele agarrou a menina nos braços, assustado. Olhou pra mim com os olhos mais abertos que podia. Ofegante disse: "O que estava fazendo com a minha filha?". Como explicar uma situação como essa? Eu realmente estava abraçada com a filha de um homem que eu não conheço, aos prantos e tão assustada como se fosse culpada de um crime: "Senhor, perdão. Sua filha estava sozinha e assustada. Eu estava apenas..." E ele me interrompeu, desta vez com a voz serena e firme: "Eu já entendi, eu que lhe peço desculpas. Foi um descuido meu deixá-la sozinha. Obrigado por cuidar dela". Ele simplesmente se virou e foi andando em direção a multidão com a menina nos braços, sem dizer mais nada. Não sei se eu estava assustada demais com a situação, ou se realmente estava certa, mas nos meus pensamentos ele parecia fugir. Ela olhava pra trás, e alguma coisa nos olhos daquela menina me diziam "Não me deixe ir". Eu voltei ao meu camarim, e mais uma vez para minha surpresa maior, encontrei em cima de minha mesa de maquiagem o ursinho azul. O que estava acontecendo? Meu cérebro deu voltas dentro da minha cabeça, e eu estava confusa como nunca. O que estaria fazendo aquele urso azul, sujo em cima da minha mesa de maquiagem?
Guardei o urso junto das minhas coisas, quase tudo já estava pronto pra minha partida. Decidir largar o circo e ter uma vida normal longe de toda fantasia não tinha sido uma decisão fácil. Era a minha família afinal, tantos anos ao lado de pessoas tão maravilhosas que cuidaram de mim como filha. Mas eu sabia que tinha escolhido o certo, que eu precisava viver uma vida diferente e não voltaria atrás.
O dia da minha partida foi o mais triste da minha vida, fizeram uma despedida e tanto. Um dos meus melhores amigos, Marcos, que trabalhava como palhaço, foi o que sofreu com tudo aquilo:
- Você sabe que vou sentir sua falta, não sabe?
- Eu também vou sentir muito a sua.
- Anita, há algo mais te deixando triste além da sua partida?
- Já que perguntou, precisava mesmo falar sobre isso. Na minha ultima apresentação, havia uma menina, diferente de todas que eu já vi, e aconteceu uma coisa muito estranha. Ela segurava um ursinho azul nas mãos...
- Igual ao seu?
- Esse urso que estou levando comigo é o dela.
- Anita, não pode ser. Esse urso está com você há semanas, sua ultima apresentação foi neste sábado.
Fui pra casa atordoada com tudo o que Marcos me disse. É claro que deve ter havido algum engano, eu nunca vi esse urso antes. O apartamento era pequeno, não havia muitos móveis e eu precisava de um emprego com toda urgência. Arrumei algumas coisas, coloquei o ursinho na cômoda. Extremamente cansada dormi, o dia seguinte seria longo.

Pra Não Entender - Baú

a janela se abre todos os dias para o sol, mesmo que ele não esteja afim de brilhar um pouco mais como o de costume. eu sei que hoje o sol pretende dormir o dia inteiro, está cansado de iluminar sempre e não receber nada em troca. ele me contou que sente raiva as vezes de tanta coisa acontecendo em sua frente quando não pode fazer absolutamente nada a não ser existir. o dia foi de silêncio, mal conversou comigo como faz de costume, abriu os olhos, sorriu meio sem graça, eu sorri de volta, mas foi apenas isso o dia inteiro. se ele quis conversar por alguns minutos, não perguntei, respeitei aquele silêncio que parecia eterno, eu sempre entendo. são muitas coisas pra ouvir, muita gente pra interpretar e nem sempre o sol pode dar conta do recado de ser amigo. penetrou em si mesmo para respirar aliviado. preferi deixar o seu silencio, deixar o seu calor e sua luz para me esconder. sol, me desculpa se fiz errado, mas apenas hoje, só hoje, eu preciso estar bem.

Temporais - Baú

uma vez o vento me disse que algumas pessoas deveriam ser levadas com ele pra bem longe, que algumas partidas seriam dolorosas e outras eu nem sentiria falta. curiosa como sempre fui, perguntei quais pessoas eu teria que deixar partir e ele no seu papel de vento, ventou sem me responder. assim como o vento, o tempo me disse que levaria consigo algumas pessoas importantes e outras nem tanto assim, mas disse que me ajudaria a esquecer passando rápido e levando também a dor e algumas memórias. perguntei mais uma vez se ele poderia me dizer quem seriam as pessoas e ele passou, no seu papel de tempo, sem me responder. depois de algum tempo e algumas tempestades essas pessoas realmente foram levadas da minha vida, algumas deixaram marcas que estou deixando com o tempo, outras ventaram tão rápido que eu nem vi passar, mas você... você está aqui. eu pensei que depois de tantos motivos pra ser levado, e de tantos furos que eu dei, você seria mais um que voaria com o tempo, desculpe-me o pensamento. mas aí eu vi que mesmo com tudo, eu amo você de verdade. e que esse amor não é um amor qualquer, é um amor que supera, perdoa, entende e se reconstrói mais fácil que os outros. agora eu aprendi, quando tempo passar e mesmo que o vento voe bem forte, você está agarrado comigo, sempre e sempre.

As Cartas de Isabelle - Baú


Janine se despediu com o coração na mão, não queria de forma alguma que Isabelle fosse embora naquela chuva. Implorou várias vezes pra que não fosse, mas não podia, ela tinha que ir antes que soubessem que estava lá. A despedida era sempre apertada, sempre dolorosa com chuva ou sem chuva, pois sabiam que depois dessa, muito tempo se passaria até que pudessem se ver de novamente. A distância atrapalhava e muito todo o amor que sentiam, mas permaneciam firmes e fortes até o próximo reencontro. Mas esse pareceu diferente, tinha um ar de despedida pelo menos para Janine:
- Você vai me deixar, não vai?
- Deixa de besteira, Janine. Você sabe que nunca abandonaria você.
Enquanto Isabelle partia, Janine correu para observá-la da janela de madeira velha e corroída, olhava pra a menina que corria naquela tempestade com as mãos na cabeça numa pseudo-tentativa de se proteger de algo que não podia. Cada segundo que se passava ela corria pra mais longe, até desaparecer. As lágrimas de Janine não se controlaram e caíram, pela primeira vez estava triste após os momentos que passaram juntas, normalmente ela sorria e cantarolava pela casa arrumando-a para que ninguém percebesse que Isabelle estivera lá. Mas hoje, ela queria apenas deitar e chorar. Seu coração sabia que ela jamais voltaria, sua intuição alertava que esta fora a última vez e não estava errada. Isabelle nunca mais apareceu, as cartas que chegavam com freqüência já não apareciam mais. As ligações com hora marcada eram a esperanças que alimentavam Janine todos os dias às cinco da tarde, ou mesmo toda vez que ouvia o telefone tocar. Nunca aconteceram. Foi então que Janine decidiu mandar uma carta, mesmo sabendo que poderia chegar às mãos erradas, que poderia estragar a vida de Isabelle:

“Isabelle,

Não foi o bastante? E toda a aventura que lhe proporcionei? Todo o amor proibido que vivemos não foi o suficiente para sua felicidade? Você prometeu, disse que jamais me abandonaria. Você sabia que a minha vida sem você não era vida. Então o que te levou a ir embora assim? Você não entende, não é mesmo? Você não sabe o que é viver longe do mundo, longe de tudo o que posso chamar de esperança. Você não sabe o quanto me dói passar os dias esperando que o telefone toque e seja você pra me dizer que vai voltar. Já sei! Uma mulher não poderia satisfazer todos os desejos de Isabelle Moura.

Não quero que você se comova com esta carta e volte para me consolar. Quero apenas entender o porquê de toda a sua desistência. Não acredito mais no seu amor, não acredito que você tenha me amado um segundo sequer. Você mentiu para mim, iludiu a única pessoa que poderia estar do seu lado e não te machucar. Eu não posso entender que tenha sido apenas uma aventura na sua vida. Parecia real. Mas já entendi que me enganei. Você é a decepção da minha vida.

Adeus.

Janine”

Numa tarde cinzenta, assim como aquela em que Isabelle partiu pela última vez, chamaram Janine mil vezes e não tiveram resposta alguma. Não era normal, já que Janine mal saía de casa e recebia todos que batiam a sua porta. Então arrombaram. A cena que presenciaram era a mais horrível que poderiam ver. Naquela cidade pacata, onde tudo era velho e cinzento, uma cena como essa não era comum, todos viviam uma harmonia-cinzenta assim como tudo naquela cidade. Mas não isso.
Janine estava estirada ao chão, a mancha de sangue cobria todo o tapete marrom da sala, um pedaço de papel do lado esquerdo se misturava com a cor vermelha e do outro uma faca enferrujada também suja da cor. No papel dizia:

“Janine,

Por muito tempo tentei entender os sumiços de Isabelle. Por dias e mais dias quis entender porque ela se afastava de mim como se não me amasse mais e passava tanto tempo fora. Quando recebi sua carta, pude compreender tudo o que Isabelle passou e não queria me contar. Eu sei que essa não é a melhor forma de lhe dar esta notícia, mas agora posso entender porque Belle quis me deixar. Ela está morta, Janine. Em um dia voltando de uma visita que fez a você, ela brigou comigo e me disse que não me amava mais, que havia encontrado outro que a faria feliz. Arrumou as suas malas, e me parecia decidida a me abandonar. Belle saiu correndo pelas ruas chorando muito e dizendo que nunca mais voltaria. Um carro que vinha em sua direção não parou e eu só consigo me lembrar dos olhos vermelhos de tanto chorar estirados no asfalto molhado e frio. Não tenho raiva de você e muito menos de Isabelle. Espero que agora você possa entender o quanto ela te amava e desejava estar contigo.

Um abraço.

Edgar”

Praia - Baú

não havia o vento ou chuva, tudo era seco. não havia areia branca, apenas aquela areia amarela suja e fervendo. ele fechou os olhos, ouviu o barulho que o mar fazia e sentiu o sol, não como fazia todas as manhãs de caminhada na praia. nesta manhã estava tudo diferente, sua alma parecia saltar de seu corpo, seus olhos pesavam, seus pés seguiam por si próprios. nessa manhã não existia mais a razão, não existia mais o sentido de nada, nem do mar, nem do barulho das ondas, muito menos do calor do sol. caminhou por mais algum tempo de olhos fechados, quase implorando um destino diferente, mas ninguém o ouvia, ninguém o entendia. perdeu as contas de quantos juramentos já havia feito desde que chegara e quantas perguntas sem respostas. se jogou de joelho ali, nem ele sabia onde e chorou, como criança, como se chorasse a morte de alguém, e era. não teve chance de abrir os olhos, apenas caiu, sentiu sua força o deixar segundo a segundo, suas lágrimas catavam a areia do chão e traziam para o seu rosto. sua força foi se perdendo, sabe-se lá onde, talvez estivessem ficando na areia quente, assim como suas lembranças, assim como seu coração. não era a morte de alguém importante que o tirava as esperanças e o ar, não era a morte de um amor que lhe doía, ou de um pai, era a sua própria morte.

Pai - Baú

as vezes eu daria tudo para voltar a ser criança. eu sei que isso nunca vai acontecer, que uma coisa que está feita está feita e não voltará por nada nesse mundo. as pessoas tentam me consolar dizendo: "ele descansou, foi para um lugar melhor", como se só isso bastasse para curar uma dor que é incalculável. eu tenho medo de sentir de novo, tenho medo de ter que sentir saudade e não poder contestar nem um segundo, e isso é (insuportavelmente) inevitável. vai me pegar de novo mais dia ou menos dia, mas pensar nisso me sufoca. ninguém escapa de ter que ser abandonado ou abandonar alguém, é como se fosse o bicho papão da vida real. quem me dera que tudo não passasse de uma história de algum livro infantil, que diziam que o lobo mau ia comer a sua vovó e depois ela voltaria da barriga dele pra te dar a bênção antes de dormir. pessoas morrem todos os dias e quase ninguém se importa, quase ninguém vai reparar que aquele cara que tomava café na sua lanchonete não vai estar mais lá, NUNCA MAIS. é aí que está toda a dor, no NUNCA MAIS, no PRA SEMPRE, são exatamente essas as palavras que me fazem entender o porquê de tanta agonia. eu era tão pequena, tão confusa e nem sabia direito o que entender daquilo tudo, eu mal pude estar com ele e saber que era a coisa mais importante da minha vida. isso corta o coração de qualquer um que vá fazer dezoito anos e perdeu alguém, talvez o alguém mais importante do mundo.
as pessoas vivem todos os dias sem se importar se aquele que está do seu lado vai embora amanhã ou vai te deixar agora. as pessoas ignoram o fato de que nada aqui é pra sempre e que uma hora você vai precisar perder alguém que NÃO quer perder. ou simplesmente você vai ter que deixar tudo sem poder contestar. por quê? são coisas que infelizmente eu tenho que aceitar, coisas que infelizmente acontecerão mais vezes do que eu gostaria. algum dia, eu espero e confio, eu vou poder ouvir só mais uma vez aquela voz, abraçar só por dez segundos aquele homem e poder segurar a única mão que me fazia dormir sem pensar em nada, sem ter medo de nada. eu espero que algum dia toda essa espera não seja em vão, toda essa dor e incapacidade sirvam pra alguma coisa e eu possa olhar os olhos castanhos claros mais lindos que já vi. eu vou amar com todas as minhas forças todos os momentos que eu não pude viver com ele, vou lembrar de cada um que a minha memória me deixar e agradecer por ter lembranças do melhor pai do mundo.

Pelamor - Baú

meus caros, estou fraca. sentei ontem em meu sofá, peguei minha xícara de café, bebi tudo em três segundos como se virasse uma dose te tequila, mas o sal e o limão eram o gosto azedo da vida. antes fosse realmente uma dose de tequila, ou duas, ou três, odeio café, e ele não arranca a minha realidade, infelizmente. analisei calmamente toda a minha situação, e descobri que não havia mais motivo pra seguir em frente buscando algo de diferente. ao contrário do que vocês todos pensam, a minha vida não é um mar de rosas, eu não sou rica e muito menos tenho o grande amor da minha vida. ao contrário do que a maioria de vocês pensam, aqueles sorrisos e beijos que eu dei no final de semana passado, eram apenas mais falsidade, mais tentativa de sair do buraco, fracassadas eu sei, mas vocês não, então conto agora para que saibam. as imagens que todos querem ver são mais acessíveis, eu entendo, mas não custa nada tentar mostrar o outro lado da moeda mesmo que ninguém queira saber. parei de tomar meus remédios, parei de procurar a salvação faz tempo, desde que tudo perdeu o grande sentido. como podem dizer pra mim que a vida não é feita de amor? mas é claro que a vida é feita de amor, a minha vida é feita de amor, se a sua não é, sorte a sua. pra mim o amor é a salvação e a decadência. é dele que se retém tudo de bom e de ruim do mundo. se não faz o menor sentido pra você, então, pare de ler este texto, esse blog, e mais uma vez a sorte é sua. eu não sei mais viver fingindo, não sei mais viver contando números que não batem no final, minha conta está sempre errada, e é tão fácil na teoria. faço a mesma conta a quase dois anos, e ela nunca consegue chegar perto da igualdade, ela não sabe chegar a lugar nenhum na verdade. burrice! é claro, mas não falta de esforço, afinal, são dois anos, e não duvido que venham mais alguns por aí. como é divina e incrível a vida, pra você, pra mim não passa de dias consecutivos da mesma ladainha dos pobres mortais que se acham a última gota de vinagre do potinho da alcachofra. pelamor da santa de barro que vocês tanto amam, tenha dó do meu ouvido e da minha dignidade burocratizada. vou voltar pro meu café/tequila, meu cobertor me parece mais aconchegante do que todos esses abraços visíveis e insensíveis.

Sem título - Baú

já quis falar-lhe sobre o muito que me toma de amor. acontece que toda vez que abro a boca para cortejar-lhe me perco em ti, nas profundezas do seu olhar, na maciez da sua boca doce-molhada e na vontade enorme que me consome quando percebo o quão perto estou de seus abraços protetores. calo meu silêncio antes das palavras, e sem pensar me jogo de cabeça em ti, pra ti. perdi-me. tudo parece tão mais fácil e belo. não pare! continue apertando forte. é aqui, nesse simples abraço demorado, que pretendo passar o resto dos meus dias.

O Curioso Caso de Benjamin

Às vezes estamos em rota de colisão e não sabemos. Seja por acidente ou por destino, não há nada que possamos fazer.

Uma mulher em Paris ia sair para fazer umas compras, mas esqueceu o casaco e voltou atrás para ir pega-lo. Quando pegou o casaco, o telefone tocou, parou para atender e falou durante uns minutos. Enquanto estava no telefone, Daisy ensaiava na Ópera de Paris, e enquanto ensaiava, a mulher que falava ao telefone saiu para pegar um táxi que acabou pegando outra mulher. Um taxista terminou seu serviço mais cedo e parou para tomar um café. E durante esse tempo todo Daisy continuava ensaiando. Esse taxista que acabou seu serviço mais cedo e que parou para tomar um café pegou a mulher que ia fazer compras e que perdeu o táxi anterior. O taxista foi obrigado a parar devido a um homem que estava atravessando a rua e que tinha saído 5 minutos mais tarde para seu trabalho porque tinha esquecido de ligar seu despertador. Enquanto esse homem, atrasado para o trabalho, estava atravessando a rua, Daisy tinha terminado o ensaio e estava tomando um banho. Enquanto Daisy estava tomando banho, o taxista esperou na frente da loja onde a mulher foi pegar uma encomenda que ainda não estava embrulhada porque a moça que era suposto faze-lo tinha terminado com o namorado na noite anterior e tinha esquecido. A encomenda foi embrulhada e a mulher voltou ao táxi que tinha sido bloqueado por um caminhão de transportes, enquanto Daisy estava se vestindo. A camioneta seguiu e o táxi continuou a andar, enquanto Daisy, a ultima a se vestir, esperava por uma de suas amigas, que tinha desamarrado um cadarço. Enquanto o táxi estava parado no semáforo, Daisy e sua amiga saíam por trás do teatro.
E se apenas uma coisa acontecesse de forma diferente, se o cadarço não tivesse desamarrado, ou se o caminhão de transporte tivesse sido mais rápido, ou se a encomenda tivesse sido embrulhada pela mulher que não tivesse terminado com o namorado, ou se o homem tivesse ligado o despertador, ou se o taxista não tivesse parado para tomar o café, ou se a mulher tivesse lembrado de pegar o casaco e teria pego o táxi primeiro, Daisy e a amiga tinham atravessado a rua e o táxi tinha passado por elas. Mas a vida, sendo como é, uma série de vidas e incidentes interligados, sem interferência de ninguém, fez com que aquele táxi surgisse - o motorista estava momentaneamente distraído - e aquele táxi atropelou Daisy, e sua perna quebrou, acabando com sua carreira de dançarina.


(O curioso caso de Benjamin Button.)

Só uma palavrinha - Baú

Textos escritos há muito tempo.

é puro, inocente, a maior coisa dentro de mim. é lindo, e é uma nostalgia grotesca. é o meu maior medo, a minha maior fraqueza, é a minha destruição e a minha salvação. é o que me mata e é o que me deixa mais feliz. é a minha razão de querer seguir em frente e o que me derruba de cara no chão. é o que me faz lembrar de tomar meus remédios e o que me lembra que eu não preciso deles porque simplesmente não quero mais viver. é a razão de todas as minhas incógnitas. é tão necessário que quase chega a ser vital, quase. se eu não soubesse que eu tenho forças o suficiente pra seguir em frente, meu desespero já teria tomado conta de mim, ainda bem que eu tenho noção disso. eu me entrego, eu sei. eu me deixo ser fraca, eu também sei. eu me deixo cair, e é fato. qualquer um sabe disso. eu supero. mas quer saber o que realmente me destrói? não é ter que esquecer, não é ter que deixar pra trás, muito menos não saber como fazer isso, porque eu sei. o que me destrói é saber que um dia eu vou olhar pra trás, lembrar de você, e não sentir absolutamente nada, e isso é estranho, isso é ridículo. assim como outros passaram na minha vida, você será apenas mais um, e eu queria tanto que você fosse diferente de todos eles, mas você parece não querer ser. você tem toda razão, uma hora as pessoas chegam no seu limite, e o meu amor transformaria qualquer limite dentro de mim. mas você QUER o meu amor? ou você quer a solução pro seu orgulho ferido? olha, é fácil achar resposta pra todas as MINHAS perguntas.mas pro seu objetivo é impossível. ao mesmo tempo que eu conheço cada palavra sua, e te entendo em cada segundo, eu olho mais uma vez e vejo um estranho, que daqui a algum tempo será mais uma lembrança na minha vida, isso se você deixar. não está só nas minhas mãos, não existe só o meu amor. eu não criei o nosso universo sozinha, talvez tenha destruído a maior parte dele sozinha, mas você também quebrou muita coisa e sabe disso. eu só tenho que tomar uma decisão, que a princípio parece fácil e óbvia, mas é a decisão mais importante. não estão te arrancando de mim como fizeram em todas as outras vezes com tantas outras pessoas. o seu caso é diferente justamente por isso. porque só EU posso arrancar você de mim, ninguém mais pode, ninguém sabe e nem conseguiriam. eu te daria o mundo e a minha vida, mas você quer isso? é a única pergunta de todas as que eu lhe faço, que eu gostaria que você respondesse com sinceridade. a única.

Marina - Baú

Baú - Textos escritor há muito tempo.

deitada sobre a almofada vermelha e o tapete bege combinando, olhava para o teto pensando longe. segurava uma xícara de chá, quase frio, que molhava um pouco o chão de madeira. perdera a noção de quanto tempo estava longe. fechou os olhos devagar como se estivesse com sono, mas não demorou muito a abrir junto com a respiração longa e pesada. pensava no passado. o computador tocava los hermanos sem parar, uma atras da outra, sem enjoar. mas não fazia tanta diferença naquela hora. o telefone tocou, foi o que a dispertou por alguns segundos. levantou devagar, pegou o chá no chão e se encaminhou para a cozinha, o telefone continou tocando. voltou a sala, sentou no sofá e acariciou o gato preto de olhos claros que estava esparramado na sua cama gigante, como ele devia pensar. seus olhos mostrava a quantidade de coisas e pensamentos que deviam estar passeando pela sua cabeça, parecia estar em transe. o telefone parou. mais uma vez ela pareceu acordar um pouco mais. ele desistiu, pensou. ainda meio indecisa, levantou com calma, arrastando a meia branca no chão, e sentou-se perto do telefone. as mãos esfregavam a cabeça, o cabelo e os olhos ao mesmo tempo, a indecisão tomava conta. - devo atender? - falou alto com o gato que acompanhou seus passos e se esfregava em suas pernas. - e se ele não ligar mais? vou ligar de volta. - pegou o fone com rapidez, digitou os quatro primeiros números e voltou a desligar. - ele não merece. -

mal conseguiu dormir, a noite foi longa, a cama parecia ter pregos, se controlou ao máximo para não procurar comunicação e no fim, dormiu.
quando acordou, não o achou na cama. procurou no celular alguma mensagem. percebeu que havia largado o computador ligado, ele sempre desligava. o chá estava cheio de formigas na pia, nenhum pedido de desculpas em lugar algum. saiu, olhou o correio, coisa de adolescente desesperada e com medo. nada. - afinal, porque tanto medo? ele sempre fez isso, ele volta.... ele volta. - repetiu baixinho quase sem perceber, como uma prece. não estava mais aguentando. chorou. enfiou a cara no sofá, implorou a todos os deuses que nunca acreditou pra não deixar que ele ficasse longe, ela sentia saudade, ela sentia falta da rotina e até mesmo das brigas. pediu perdão sozinha e pro vento. somente o gato ouviu. se sentiu sozinha, nada tinha uma razão ou algum motivo concreto pra existir. a casa era mais vazia do que nunca, ele enchia tudo com suas palhaçadas que irritavam as vezes. mas ele estava alí e as vezes ela não dava valor. ele mesmo dizia: "quando eu morrer, você vai desejar com todas as forças ter as minhas lambidas e não vai ter". e nem por isso ela deixava ele lamber o seu rosto, achava nojento. agora chorava, e implorava pra ter uma lambida. só uma. - só uma. -
o telefone voltou a tocar e dessa vez ela correu muito pra atender:
- Alô?
- Marina?
- Ah, é você.
- Porque está chorando?
- Você sabe.
- Você está assim a meses, isso tem que passar. Posso ir aí?
- Não.
- Não fale assim, só estou tentando ajudar.
- Eu sei. Me desculpa.
- Posso?
- Tente entender, eu não quero agora, eu preciso ficar sozinha.
- Isso não vai te ajudar em nada.
- Talvez não, mas eu preciso.
- Vou tentar te entender. Só por favor, tenta parar de se iludir.
- EU NÃO ME ILUDO.
- Não se exalte.
- Então me deixa.
- Ele não vai voltar, você tem que parar com isso, só vai te fazer mal.
- PÁRA!
- Marina, você está se torturando demais.
- Se é tortura ou não, é a MINHA TORTURA. Você não pode me pedir isso. VOCÊ NÃO SABE O QUE É. Você não imagina a dor, você sequer sabe o que é esse vazio. PÁRA! Me deixa. Me deixa, deixa a minha dor e a minha tortura, me deixa morrer aos poucos.
- Eu não vou insistir mais. Você quem sabe. A minha opinião é clara, a opinião de todo mundo é clara, só você que não quer enxergar. Talvez enxergar a realidade seria menos dolorosa do que se iludir como se ele estivesse vivo.
- Ele está vivo, não fala assim.
- Eu vou desligar, se quiser, saberá onde me encontrar.
- Ele está vivo.
- Você sabe que não está. Estou indo.
- Está, você não conhece ele, ele sempre aparece, ele vai aparecer dessa vez, você vai ver.
- Não vou mais ouvir isso, você precisa parar com isso. Está magoando todo mundo desse jeito.

ela desligou.

Hora de Acordar - Baú

ainda hoje eu sei que você cometeria o mesmo erro. eu já não sei mais quem é o verdadeiro carrasco, quem engana ou quem se deixa ser enganado. o risco da escolha é todo seu, mas talvez você magoe alguém que te ame de verdade para viver uma ilusão. quando você escolhe se cortar mais uma vez, você não está apenas se machucando, mas magoando muita gente que não aguenta mais ver esse vaivém. em algum momento de toda essa história você vai entender que isso é mais doentio do que imaginava, vai saber que todos aqueles dias que você pensava estar sofrendo eram apenas mais dias de uma historinha que poderia ter sido evitada. não se engane, isso nunca vai pra frente e quanto mais insistir, mais você perderá a melhor parte da sua vida com um vácuo que se criou diante de tantos buracos deixados para trás. feridas todo coração tem, ser forte e aguentar curar todas elas é que quase ninguém sabe ser. não pense que que a fraqueza é a sua melhor amiga nessas horas, não é e nunca será, ela apenas serve pra te afundar mais. pense... quanto antes você fechar o livro do encanto que já foi quebrado a muito tempo, melhor vai ser o caminho que irá trilhar. parece que quanto mais ele erra com você, mais você gosta, mais você corre de encontro ao abismo. acorde, afundar nunca levou ninguém para outra direção.